Perdoar ou não perdoar...
Perdoar ou não perdoar ...
Perdoar, dar+em frente, dar-se um presente no futuro. Se “o perdão é um presente que se dá a si mesmo”, então perdoar não é sobre o que lhe aconteceu, os factos ou as circunstâncias. Perdoar não significa que o que lhe foi feito está certo ou deve ser tolerado, perdoar não quer dizer que concorda com o acto sofrido. Achamos que conseguimos perdoar se (e somente quando) o outro pedir desculpa pela dor causada, pelas ações erradas, pelas conseqüências das suas ações ... mas isso raramente acontece. Para os humanos admitirem que estão errados, precisam ver para além da dor e do medo que a sua própria situação foi criada para proteger. Mas continuamos à esperar que o outro veja a nossa dor e isso não é possível. A menos que a outra pessoa tenha alguma consciência e auto-conhecimento das suas próprias feridas e o quanto estas feridas controlam o seu comportamento.
Enquanto isso não acontece, a nossa mente continua repetidamente a querer que algo seja mudado no passado e isso garantidamente não vai acontecer. Resta perguntar, como perdoar se o autor do abuso nem consegue reconhecer o mal feito? Lembre-se, o perdão é o que se dá a si mesmo. Não é responsabilidade da vítima perdoar o ofensor. Se for uma questão legal, deixe a justiça lidar com o assunto. Se for uma questão moral, deixe que a consciência dele se encarregue disso, ou se você acredita em algo superior, permita que justiça divina seja feita. Não me compete a mim perdoar a outro, não tenho esse tipo de poder. Eu não sou juiz nem sou Deus.
Perdoar é verdadeiramente o primeiro passo para a liberdade. Mas o caminho para o perdão não pode ser apressado. É uma estrada única não pavimentada, nunca sinalizada antes deste momento. Quando me perguntam como perdoar um abuso horrível, duas coisas me vêm à mente. Eu digo, sim, tenha intenção de perdoar, mas por favor, apenas depois de reconhecer a sua dor. O que está a doer, o que está a acontecer consigo, dentro do seu corpo e da sua mente? Veja-se a si mesmo primeiro, veja a ferida, limpe-a da melhor forma possível, dê tempo e espaço para a cura. O seu processo é único, não tem regras, nem prazos pré-determinados. Cuide-se, cuide da sua dor, pois esta precisa da sua atenção.
Eu acredito que quando não cuidarmos das nossas próprias feridas, iremos sangrar sobre outros que nunca nos magoaram. Devemos ser responsáveis pelas nossas ações e ter consciência do que as nossas dores estão a causar em nós e dentro de nós. Se não corremos o risco de magoar outras pessoas que amamos apenas porque estamos magoados e não sabemos lidar com a nossa dor. Temos realmente poder para parar o ciclo de abuso, cuidando das nossas dores.
Quando ou se nos apressamos a perdoar, podemos estar a virar o abuso sobre nós mesmos. Ao forçar seguir em frente e perdoar ignoramos a dor que corre profundamente nos nossos corações, nos nossos corpos. Desta forma o perdão não liberta mas continua o abuso causado pois ignora o que nos vai dentro.
Estabelecer o objetivo de perdoar, pode ser muito libertador e quando o fazemos, conseguimos realmente viver. Defina a intenção de perdoar, mas primeiro honre a dor e o tempo que precisa para segurar esta dor com carinho e auto-cuidado. Pois é a melhor maneira de nos vermos inteiros. Mantendo ambos, a intenção de perdoar e a parte ferida, juntos, consegue ver-se e segurar-se num todo.É aqui, na unidade, que começa a cura. É o que chamo a dança entre aceitar onde estamos, como somos e o que sentimos com a intenção de quem queremos ser. Esta dança cria a primeira etapa da cura. É aqui que o AMOR cria a sua magia. O amor-próprio cresce a partir desse espaço emocional, aparece a auto-aceitação, cresce o auto-cuidado. Esta primeira fase pode levar o que muitas vezes parece muito tempo.
Perdoar ou não perdoar? Não importa qual escolhe. O importante é escolhermo-nos e vermos-nos inteiros, honrar as nossas circunstâncias, a nossa dor, as nossas expectativas, ao mesmo tempo que ouvimos os nossos corações e sabemos que nunca há nada a perdoar.